quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Luto e Melancolia


Freud publicou Luto e Melancolia em 1915, anos depois do surgimento do Vera Sibilla na Itália. Mas as cartas Vedovo e Malinconia (Viúvo e Melancolia) bem poderiam ilustrar o pequeno artigo. Hoje chamamos a romântica melancolia por outro nome mais seco e que causa silêncio onde ecoa: depressão.

A primeira coisa que se destaca pela comparação das duas cartas é a cruz que - imaginamos - marca o local de um túmulo, provavelmente de uma pessoa querida ao viúvo e à melancólica. Mas por que duas cartas para falar de tristeza pela perda de alguém? Ou por que a cruz está presente em duas cartas que podem falar de situações que não seguem obrigatoriamente juntas, como morte e depressão? Pois é justamente a perda que une essas duas cartas. Mas cada um deles perdeu uma coisa diferente.

O luto é um processo. Tem começo, meio, fim. Um processo largamente ritualizado em nossa sociedade: o preparo do corpo, o velório, o enterro, a reclusão da família, a missa de sétimo dia. É o momento de tirar todo aquele amor que investimos naquele ente querido e redirecionar... devagarinho... para outras coisas. Com o tempo a dor torna-se suportável, a presença do morto (mais do que a ausência) pesa cada vez menos. No luto, sabemos o que estamos perdendo. Sabemos que é preciso seguir em frente. Sabemos que, ao menos nós, temos uma vida com a qual lidar.

A melancolia é um estado. Tem ciclos, mas nunca se sabe se terá fim. É uma coisinha que vai se alastrando dentro da gente aos poucos. Os outros dizem que é bobagem, que é desânimo, que é falta de um tanque de roupas para lavar. E assim, como um rio subterrâneo, vai criando afluentes e tomando todo o espaço sem nos darmos conta. É uma perda, mas sabe-se lá de quê! 

Segundo Freud, o melancólico não sabe o que perdeu, mas identifica-se com esse objeto. Esse objeto perdido torna-se ele mesmo. Portanto, o melancólico perde a si mesmo. E quando isso acontece, quem saberá escapar desse labirinto?

Logo, o Vedovo mostra uma situação que pode ser superada. Um período difícil, mas onde há consciência dos caminhos espinhosos a serem seguidos. Haverá saída depois de determinado tempo.

Malinconia é uma armadilha. É importante descobrir o objeto que o consulente perdeu para que ele possa começar a entender o que está acontecendo: é a criança interior? É uma pessoa que se amou? É o desejo de ser livre? Geralmente o que se perde aqui tem um caráter idealista, vaporoso, quase impossível de apalpar. As cartas próximas à cruz (à direita, embaixo ou na diagonal inferior direita) podem dar pequenas pistas.

Não podemos dar um mapa da vida aos nossos consulentes. Mas podemos ajudá-los a enxergar melhor para que eles encontrem seus caminhos em seus próprios mapas. 

2 comentários:

  1. Excelente texto! Sou estudante de Psicologia e acho esse um dos textos mais importantes de Freud. Analogia perfeita entre cartas e psicanálise, me ajudou bastante a entender essas cartas da Sibilla :)

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    1. Que bom que gostou, Isadora! Sou estudante de Psicanálise e enquanto estudava esse texto do Freud não conseguia parar de pensar nas minhas cartinhas.

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